lótus

lótus é uma planta
com raízes na lama

as sementes esperam
até cinco mil anos
pela umidade e temperatura ideais

a flor de lótus é uma flor
que dorme
à noite

uma flor que dorme à noite

na odisseia, apagou
a memória dos homens
em ovídeo, alucina e transforma

você, quando escreve
como e
com que partes costuma fazer
seu nome

a flor desmancha e rabisca
os pés imprimem o retorno
os membros avistam antes
das vísceras que avisam
o visco do sonho

quem disse
que você é
o que come
Publicidade

com sumo

dormir sobre o branco
sorver do leito o alimento
acomodar a face na margem
de onde sulco não brota

nenhum galho
quebra
nem um ai, nem um pio

a lâmina permanece
faz-se morta
trovão atiça a matéria
que liquida e soçobra

o jardim o bosque
aorta
bate na boca
da caçapa
enche de mel
repugna
perde o xaxim

tudo apodrecendo feio
a narina sorvendo
o gosto que exala
do último episódio

doce de doer

na devastação gasosa
tudo atrás do toco
não demora em ser
fratura exposta

mão de obra

primeiro, foi preciso amarrar a casa pelo teto
levantar estrutura
trançar e travar bem
as estacas

depois, cobrir
aparando de cima
o que lançam de baixo
depositar as peças uma a uma
sem quebrar
a cabeça no barro

por fim, deixar o tatame suspenso
e ir descendo com cuidado

é preciso confiar em nós
acreditar no trabalho
é preciso esperar
pelas primeiras águas
ver como se comporta o telhado

uma casa se amarra pelo teto
e às vezes há que aceitar
a desforra como convite
do vendaval
para armar um novo barraco

duplotropismo

tempo em que os poros se abrem
para as trocas homeostáticas

as raízes sobem

tempo de arrebentar a calçada
sem bater
craquelar o cimento por baixo
e arruinar a tubulação
deixando que os dutos
vazem

hora de estiolar o caule
provar que a terra é do sol
inseparável

hora de revelar os extremos
revidar as podas
hora extremada em que a força geocêntrica
dá as caras

na cabeleira firme que uns chegam
a fazer casa
tem a hora do ente
mover

é mover
ou aparar a machadada



mudra

recluso
o corpo meio 
que desaparece
só a mente em
moto-contínuo
maquina

o resto
é estômago

e queda

falta de exercício
falta de sol
falta o espaço do caminho
ao espelho
vivo
que devolva e diga:
esta é você
que está aí-
-nda

por isso a fala
que se movi-
menta
a fala sobre
o movimento sim
ela vivifica

vontade de mover é
vontade de corpo
chance

de jogar energia
às extremidades, diz a moça
invertida

pensar em
ir e vir
à vontade
também

traz a tensão
ao bloco apagado
pulsando contido

há que mover
as pontas
bater as palmas &
panelas em tampas
até inoxidar o ar

plantar bananeira
com o pé sujo
na cortina

há que pulsar
o que se perde
para o inerte

parar de anestesiar

só o vivo dói
o morto tende ao contínuo

há que acariciar
a calçada
com as plantas
até queimar
o tendão

sair para ver as araras
quando possível
reverenciar sua cor
subir no dorso
do seu grito

deixar que vibre

ponto-furo, outro

venta o tempo
na água dos mortos
suspende a flora podre
à venta temblorosa
da borda

o tombo do jambo perturba
o leito das folhas
mexe o leite turvo arrasta
a nata

círculos do umbigo na solução
parada

rubro sobre o negro
o fruto boia com a marca
branca da bicada faz
supor macilento o
de dentro
fora
aquilo oblíquo no sistema transitório
que se
instala

1. captura
2. uma perspectiva
3. presa na distância
condenada à órbita:
vê sem tomar parte
do mergulho
sequiosa

parece letra o que tropeça e cinge e fura
sem saber
das dimensões do lago

da natureza metálica

metal incandescente
                        não cobre
metal plutônico metal ardente
absconso na rocha que
previne o transbordamento no choque

metal in-
	   -can-
	           - descente
sente a ponta na
perfuração da crosta a-
		        -bafa
                        sopro sobre o magma
                        ígneo desígnio meta-
                        -mórfico

deixar que respire
ver como desloca
centro incendiado
cinza que descobre
faz jovem

metal incandescente
núcleo ígneo coisa mole
move-se pelas galerias
molda-se às oquedades

metal incandescente
rútilo visco
metal indecente
risco
que trans-
	    - borda nessa experiência de laboratório

metal incandescente
imagem inerte
da natureza pulsada
espelha a labareda
iridescente
           árvore prateada
massamorda

quebrar copos

quebrar copos como
procedimento para
não entornar o caldo
a evitação do óbvio e
a venereação do falo

quebrar copos como
prosseguimento e contiguidade
sem tranco do punho
ao vidro e
estilhaço

quebrar copos como
apuro redução e compostagem
o fermento
fétido do desastre

quebrar copos como
quem recruta ao mosaico
reúne o que nunca fez
parte

como se perdoasse pela
opacidade agora
e na hora luminosa
do baque

como se relevasse
o polimento bruto
que fez do brilho
embaço

como se acordasse
pedindo água ar
ou talho
esperando
por quem raspa o fundo do maldito requeijão
como se amas-
-sasse